Foco Amazônia #6: edição de maio de 2022.
“Contra o desmatamento” até a página 2: relatórios estaduais mostram ineficiência do Estado na execução do REM
Novo PL tenta liberar o licenciamento na BR 319 enquanto SEMA cria parceria público-privada para gestão de UCs do Amazonas; MT estuda liberar pecuária em área de reserva legal.
O Foco Amazônia de maio destaca iniciativas legislativas bastante sensíveis em Mato Grosso e no Amazonas. No Acre, a [falta de] publicação dos relatórios do Programa REM desperta atenção. O monitor capturou 14 atos e propostas relevantes no subnacional da Amazônia Legal.
REM no Acre: boas intenções até a página 2
Os relatórios das fases I e II da execução do Programa REM no estado do Acre não deixam dúvidas de que, apesar do que prevê o desenho institucional, na prática, o programa não obteve o sucesso esperado na redução dos números de queimadas e desmatamentos. Pelo contrário, em vez de incentivar a conservação por meio de premiações àqueles que preservam, o programa se mostra estagnado, com ações a passos lentos e inversamente proporcionais ao aumento do volume de queimadas e desmatamento indicado pelas páginas do próprio relatório publicado pelo Instituto de Mudanças Climáticas – IMC , órgão ligado à SEMAPI responsável pela execução do programa.
O número de focos de queimada no estado cresce desde 2017 (6.295), com pico em 2020 (9.193), segundo o INPE. Mas o poder executivo do Acre insiste em comparar a devastação com outros estados amazônicos, na tentativa de minimizar o avanço da perda de floresta em seu território. Os dados de desmatamento seguem a mesma lógica.
O último documento referente às atividades do REM disponível diz respeito ao ano de 2020: ainda não houve prestação de contas em relação aos últimos 18 meses, ainda que a regra preveja a publicidade dos números a cada semestre. Com relação ao desempenho abaixo do esperado e assumido pelo órgão, o IMC justifica, em trecho extraído do relatório de 2020, que o êxito “não foi possível diante de uma série de circunstâncias político-administrativas”, entre as quais estão incluídas trocas de gestão, mudanças de equipe técnicas, “entre outros”. No item “monitoramento” o laudo aponta que não havia, em 2020, uma equipe realizando esse trabalho para o qual seria convocada uma licitação. Outras seções do documento mencionam as dificuldades de trabalho de campo geradas pela pandemia e prometem correção em 2021. Resta publicar o último relatório anual para analisar se o novo calendário foi cumprido.
A Política por Inteiro questionou o IMC sobre os relatórios em atraso e se os problemas de ordem “político-administrativas” e de conjuntura sanitária persistiram nos últimos semestres. A assessoria de imprensa do IMC informou que o relatório de 2021 já foi elaborado, mas “não foi publicado porque aguarda anuência do Banco KFW”, sigla do alemão que financia parte do projeto. A assessoria ainda informou que diante do atraso das entregas causado pela pandemia, o banco de fomento estuda prorrogar o prazo de execução para 2025. O adiamento está em fase de negociação, mas é certo que haverá extensão em pelo menos um ano, com provável remanejo de recursos.
Recentemente , em maio de 2022, parte da equipe técnica se reuniu à Secretaria de Planejamento do Acre para avaliar a fase II e traçar planos da próxima etapa do programa, mas os detalhes da pauta da reunião e avaliações ainda não estão disponíveis para acesso público.
Deputado do Amazonas tenta facilitar para BR 319
As disputas e interesses envolvendo a BR-319 ganharam mais um capítulo em maio. O deputado Fausto Junior (União Brasil), que há poucas semanas propôs liberar o licenciamento de rodovias, dessa vez apresentou um projeto específico para “incentivo à conclusão da rodovia BR 319”, pois, segundo parlamentar, “urge a necessidade de regulamentar a matéria no âmbito do Estado do Amazonas a fim de evitar ainda mais entraves que impeçam eventuais intervenções básicas que se façam necessárias para recuperação da BR-319”. A antiga polêmica nasce da preocupação com o impacto socioambiental da infraestrutura: matéria recente da Folha de S. Paulo calcula que uma área compatível com o estado de São Paulo seria devastada.
A reportagem do Eco captou o projeto no monitor Foco Amazônia e repercutiu o tema com especialistas em meio ambiente e políticas públicas que vivem em Manaus. O portal Infoamazonia denuncia que as comunidades indígenas e lideranças extrativistas não estão sendo devidamente consultadas no processo de licenciamento da obra.
Conheça o novo site do Observatório da BR-319 . O site é o maior repositório de informações sobre a rodovia, com acesso a dados e infográficos de monitoramento de focos de calor e desmatamento; mapas de UCs e TIs; documentos e fatos sobre a BR-319 em ordem cronológica; artigos, estudos e pesquisas.
Mato Grosso quer liberar pecuária em área de Reserva Legal
A Assembleia Legislativa de Mato Grosso se prepara para tramitar a alteração da Lei do Pantana l ( nº 8830/2008) , um projeto de iniciativa da Comissão de Meio Ambiente que pretende liberar atividades agropecuárias em área de reserva legal. A nova legislação é resultado de um estudo da Embrapa Pantanal encomendado pela SEMA do Mato Grosso . Na última semana, a secretária de Meio Ambiente Mauren Lazzaretti se reuniu com deputados para defender a proposta de “exploração sustentável” que justificou ser um caminho para desenvolvimento econômico e social do “homem pantaneiro” e fomento ao turismo sustentável.
A Política por Inteiro teve acesso à minuta do texto da proposta de lei: a mudança envolve supressão de vegetação no bioma, manejo para conservação e limpeza de áreas, uso do fogo como medida preventiva e permissão de recomposição de pastagem. “ Nas Áreas de Conservação Permanente relacionadas nos incisos deste artigo será permitido o a cesso e uso para a pecuária extensiva e atividades turísticas”, cita o documento. E ainda: “fica autorizada a instalação de obras e empreendimentos de infraestrutura e abastecimento para atividades de turismo e pecuária extensiva” e “nas áreas de reserva legal na Planície Alagável da Bacia do Alto Paraguai de Mato Grosso, que possuam pastagens nativas será permitido o acesso e uso para a pecuária extensiva”.
Na justificativa assinada pelo presidente da Comissão de Meio Ambiente, o deputado Carlos Avallone (PSDB), consta o argumento de que “o acesso e uso para a pecuária extensiva auxilia a manter a biodiversidade biológica e os processos ecológicos em toda a Bacia do Alto Paraguai, sendo uma atividade de baixo impacto.” Em discurso durante o debate em plenário , o parlamentar destacou que “a inviabilização da atividade pecuária tem expulsado o homem pantaneiro da região, as plantas invasoras tomaram conta da vegetação, que sofre com incêndios incontroláveis gerando prejuízos financeiros e destruição da natureza”.
Segundo a assessoria do deputado Avallone, o projeto ainda não está tramitando porque o parlamentar preferiu abrir um diálogo prévio com outros atores. Ainda não há previsão para apresentação do texto à Casa Legislativa.
Cheias lá, seca cá
A era dos extremos está visível na Amazônia brasileira. O último mês foi marcado por eventos adversos que trouxeram transtornos e preocupação da Amazônia oriental à ocidental. No Pará , e no Amazonas , fortes chuvas e a cheia dos rios causaram alagamentos que refletiram em decretos estaduais e portarias federais de situação de emergência em dezenas de municípios. Enquanto isso, Acre sofre com a baixa do rio – apenas um mês depois de sofrer com as cheias que deixaram comunidades desalojadas em vários municípios que acionaram a defesa civil. Como agravante, a qualidade do ar típica do período seco já causa preocupações e deve alcançar um estágio crítico a partir do próximo mês. Há poucos dias, o município de Brasiléia , na região do Alto Acre, amanheceu com uma quantidade preocupante de material poluente acumulado. A SEMAPI indicou risco do início da temporada do fogo.
No tema desastres, o governo do Acre decretou a criação da Coordenação Municipal de Defesa Civil (COMDEC) do Município de Plácido de Castro, que é responsável por elaborar, implementar e gerenciar planos diretores, planos de contingência e toda a articulação relacionada a situações de emergência, incluindo a implementação de banco de dados e mapas temáticos sobre ameaças múltiplas causadas por desastres.
AM cria versão estadual de Adote um Parque
A SEMA do Amazonas instituiu o “Programa Parceiros pelas Unidades de Conservação” para compartilhar a gestão das Unidades de Conservação Estaduais com pessoas físicas e jurídicas privadas, nacionais e estrangeiras. Na prática o projeto se assemelha – inclusive no texto – ao programa não tão bem sucedido quanto divulgado “Adote um Parque”, do MMA. Aos interessados cabe o fornecimento de bens, produtos e serviços destinados à conservação das UCs mediante plano de ação que deverá ser aprovado pelo Conselho Gestor ou SEMA. Em contrapartida, o parceiro privado poderá usufruir de peças de publicidade nas respectivas áreas protegidas. O texto também prevê o “uso da unidade de conservação estadual para atividades institucionais”, desde que orientadas para o interesse público e sem fins lucrativos.
Segundo Angela Kuczach, diretora-executiva da Rede Nacional Pró Unidades de Conservação, a participação de entes privados pode ser positiva, mas é preciso observar os limites da interferência na gestão da UC. “Unidades de Conservação são públicas, pois por princípio pertencem a toda a sociedade, conforme determina nossa Constituição Federal. A gestão, bem como as funções de fiscalização e controle, portanto, deve representar esse interesse coletivo e imparcial, o que só pode ser garantido respeitando os princípios técnicos, como plano de manejo e a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação” comenta.
Boas notícias no Foco!
#Acre: voto jovem e verde. A SOS Amazônia realizou uma ação de incentivo à emissão do primeiro título de eleitor entre os jovens de duas reservas extrativistas na região do Juruá. Além de incentivar a participação política, a organização fez um trabalho de educação ambiental para motivar o voto verde consciente. Como resultado da ação, 19 jovens do Município de Marechal Thaumaturgo emitiram o título de eleitor e quatro moradores da Reserva Extrativista do Alto Juruá foram instruídos a conduzir o processo para as regiões mais distantes, o que resultou em 79 novos títulos. Outros 45 títulos foram emitidos na Reserva Extrativista Riozinho da Liberdade e da Floresta Estadual.
Equipe SOS Amazônia instruiu jovens de reserva extrativista a emitir título eleitoral.
#Amazonas: coleta seletiva. Um PL pretende tornar obrigatória a coleta seletiva do lixo. A matéria legislativa é de autoria do deputado Roberto Cidade (União Brasil), que preside a Aleam. Se aprovada , a obrigatoriedade valerá para estabelecimentos comerciais e condomínios residenciais com mais de 50 habitações. O projeto prevê multa de R$ 300 em caso de descumprimento. O valor seria destinado ao Fundo Estadual do Meio Ambiente (FEMA).
#MatoGrosso : Os deputados do Mato Grosso aprovaram e o governador Mauro Mendes sancionou a lei que institui a Política Estadual do Biogás e Biometano . A iniciativa partiu da deputada Janaína Riva (MDB), única mulher eleita na ALMT.
#Acre : Criou o Parque Municipal do Seringueiro Cria e a Comissão Municipal para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) no Município de Rio Branco
#Vergonha alheia no federal
Há quase um ano no cargo, o ministro do Meio Ambiente Joaquim Leite participou pela primeira vez da reunião do Conselho Nacional da Amazônia Amazônia Legal. Esta também é a primeira vez em que os governadores do bloco voltam a participar das reuniões após decisão do STF em resposta ao decreto de Bolsonaro que excluiu os chefes do executivo estadual em 2020.
Maio também foi marcado pela visita do bilionário Elon Musk ao Brasil. O homem mais rico do mundo se encontrou com o presidente Jair Bolsonaro e anunciou uma parceria para instalação de satélites-monitores de desmatamento na Amazônia com a intenção de comprovar, nas palavras do chefe de estado, a preservação da floresta. O episódio não passou de espetacularização acompanhada de desinformação: a floresta amazônica brasileira é monitorada desde 1988 pelo INPE e os dados indicam crescente e preocupante desmatamento. Ademais, a suposta parceria entre governo federal e a empresa de Musk sequer foi formalizada com assinatura de contrato.
Confira também as normas federais captadas pela Política Por Inteiro relacionadas à Amazônia
DECRETO Nº 11.059, DE 3 DE MAIO DE 2022
Criação do Programa de Redução Estrutural de Custos de Geração de Energia na Amazônia Legal e de Navegabilidade do Rio Madeira e do Rio Tocantins – Pró-Amazônia Legal.
PORTARIA ICMBIO Nº 325, DE 3 DE MAIO DE 2022
Aprovação do Regimento Interno do Núcleo de Gestão Integrada – ICMBio Tefé , abrangendo Floresta Nacional de Tefé, Reserva Extrativista do Baixo Juruá, Reserva Extrativista Auati-Paraná, Reserva Extrativista do Rio Jutaí, Estação Ecológica de Jutaí-Solimões, Estação Ecológica Juami-Japurá e Área de Relevante Interesse Ecológico Javari-Buriti. E ICMBio de Cruzeiro do Sul
PORTARIA MJSP Nº 83, DE 6 DE MAIO DE 2022
Autorização do emprego da Força Nacional de Segurança Pública em apoio à Fundação Nacional do Índio com objetivo de garantir a proteção dos indígenas e das populações tradicionais de Nova Olinda do Norte/AM e região, considerando os limites com Borba e Maués, no Estado do Amazonas, por 20 dias. O conflito envolve camponeses, ribeirinhos, indígenas do povo Munduruku da Terra Indígena Kwatá Laranjal, indígenas Maraguá da aldeia Terra Preta, além de traficantes de drogas, pescadores ilegais, representantes do governo e policiais militares da região do rio Abacaxis.
PORTARIA PGR/MPF Nº 299, DE 9 DE MAIO DE 2022
Criado no âmbito do Ministério Público Federal, ofícios socioambientais na Amazônia, com foco em meio ambiente, povos indígenas e comunidades tradicionais a fim de aperfeiçoar a atuação do MPF na região.
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