Operação Samaúma: a última GLO?

As operações das forças armadas de Garantia de lei e Ordem,  chamadas GLOs,  foram estabelecidas com o objetivo de atuação em ações preventivas e repressivas contra delitos ambientais, direcionada ao desmatamento ilegal, ao combate de incêndios florestais e à fiscalização.

Há previsão na Constituição Federal (artigo 142) para emprego das Forças Armadas na defesa da pátria, na garantia dos poderes constitucionais e na garantia da lei e da ordem. A decisão de emprego das Forças Armadas na Garantia da Lei e da Ordem (GLO), assim como estabelecida na Lei Complementar 97/1999 e no decreto que a regulamenta (Decreto 3.897/2001) é de competência exclusiva do Presidente da República e ocorrem nos casos em que há o esgotamento das forças tradicionais de segurança pública, objetivando a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, em ações provisórias em área restrita, de polícia ostensiva, de natureza preventiva ou repressiva “até o restabelecimento da normalidade”.

Assim, foram instituídas em 2019 e 2020, as Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) Verde Brasil e Verde Brasil 2 e, recentemente, em julho de 2021, a Operação Samaúma. No entanto, observa-se uma contradição no discurso oficial, considerando que o aumento do desmatamento e de incêndios foram fortemente negados, através de uma narrativa de que havia um exagero na cobertura dessas questões e de que era necessário combater a desinformação a respeito delas. Nesse sentido, o emprego da GLO parece estar mais alinhado com a narrativa de descredibilização das agências ambientais, deliberando uma nova governança militarizada da Amazônia. Liderada pelo Vice-presidente Hamilton Mourão, através do recriado Conselho Nacional da Amazônia Legal (CNAL), que tomou o lugar do Ministério do Meio Ambiente na atuação sobre a região e de comunicação com atores internacionais.

Não há definição clara dos papéis a serem desempenhados pelas Forças Armadas e qual seria a função da Polícia Federal e polícias estaduais, as quais historicamente atuam em campo em suporte à atuação do Ibama, o que potencializa riscos de sobreposição de responsabilidades e falhas de coordenação.  Diferente de políticas públicas adotadas no combate ao desmatamento na Amazônia, como o PPCDAM, a GLO não é política pública e não pode ser tratada como tal, trata-se de uma medida emergencial garantida pela Constituição, de apoio pontual ao restabelecimento da normalidade.

As normas que instituem e autorizam as GLOs não estabelecem metas e somente para a Operação Samaúma foi definida, oficialmente, a área de atuação. A escolha das regiões está, em parte, relacionada aos municípios prioritários de combate ao desmatamento da Amazônia Legal. Inicialmente foram selecionados 26 municípios, porém de acordo com o previsto no decreto, a operação foi estendida para os estados do Pará, Amazonas e Mato Grosso, a pedido dos governadores e autorizadas via despacho do Presidente da República. Ao todo foram 352 municípios cobertos pela GLO e 420 fora da área de atuação da operação, localizados na Amazônia Legal.

Através dos alertas de desmatamento do INPE analisamos as áreas cobertas pela Operação Samaúma, nos meses de julho e agosto de 2021, comparando esse período na série histórica para a mesma região. Em julho e agosto de 2021 foram 2.418 km² de área desmatada na Amazônia Legal e os municípios cobertos pela GLO foram responsáveis por 2.018 km², ou seja, 83% de todo o desmatamento do período. Em 2020 essa proporção foi de 81% nos mesmos municípios, o que demonstra um avanço da participação dos municípios foco da GLO no desmatamento da Amazônia.

Os dados demonstram que nos municípios cobertos pela Operação houve uma redução de 18% no desmatamento em relação ao mesmo período de 2020 mas, no restante da Amazônia Legal a redução foi de 29%. Esse resultado indica que a ação das forças armadas tem sido insuficiente para conter o desmatamento ilegal.

Mesmo que a região tenha sido escolhida devido aos altos índices de desflorestamento, a Operação Samaúma não foi eficaz no controle dos crimes ambientais.  Apesar da significativa redução do desmatamento em julho e agosto deste ano em relação ao mesmo período de 2020, a tendência de queda anual é baixa e está distante da meta, pouco ambiciosa, de 8,7 mil km² estabelecida pelo Plano Amazônia 21/22.

Os sistemas PRODES e DETER possuem metodologias e satélites diferentes, o que gera diferenças entre os valores identificados. A resolução dos satélites do DETER é menor e por isso captura apenas uma parte do desmatamento identificado no PRODES. Entre 01/08/2019 e 31/07/2020 o PRODES identificou 10.851 km² e o DETER 9.216 km². Entre 01/08/2020 e 31/07/2021 o DETER já identificou 8.793 km², com recordes em abril e maio, indicando uma tendência superior à faixa de 8 mil km² esperado pelo Plano Amazônia.


Histórico

O emprego das Forças Armadas teve início em 2019, via Decreto Federal 9.985/2019, no período de 24 de agosto a 24 de setembro de 2019 (depois ampliado até 24 de outubro de 2019 pelo Decreto Federal 10.022/2019), nas áreas de fronteira, nas terras indígenas, nas unidades federais de conservação ambiental e em outras áreas dos Estados da Amazônia Legal que requererem: ações preventivas e repressivas contra delitos ambientais, levantamento e combate a focos de incêndio.

  Operação Período Duração
1ª GLO
2019
Verde Brasil 24 de agosto a
24 de outubro de 2019
2 meses
2ª GLO
2020/2021
Verde Brasil 2 11 de maio de 2020 a 30 de abril de 2021 11 meses
3ª GLO
2021
Samaúma 28 de junho de 2021 a
31 de agosto de 2021
2 meses

Posteriormente, e conforme Decreto Federal 10.341/2020, tivemos a 2ª GLO na Amazônia no período de 11 de maio a 10 de junho de 2020 (ampliado para 10 de julho de 2020 conforme Decreto Federal 10.394/2020, depois, até 6 de novembro de 2020 pelo Decreto Federal 10.421/2020 e, por fim, até 30 de abril de 2021 pelo Decreto Federal 10.539/2020).

Ainda, em 11 de maio de 2020 foi publicada a Portaria 1.804/GM-MD, que aprova a Diretriz Ministerial nº 09/2020, que regula o emprego das Forças Armadas, sob a coordenação deste Ministério, na “Operação Verde Brasil 2” e no período de 11 de maio a 10 de junho de 2020 (prorrogado para até 10 de julho de 2020 pela Portaria 2.138/GM-MD, depois até 06 de novembro de 2020 pela Portaria 2.442/GM-MD e, por fim, até 30 de abril de 2021 pela Portaria 3.693/GM-MD), para a Garantia da Lei e da Ordem e para ações subsidiárias. Durante a atuação das operações Verde Brasil I e II, a Força Nacional de Segurança Pública- FNSP, composta por policiais militares, civis, bombeiros militares e peritos dos estados e do Distrito Federal, foi autorizada a atuar em apoio às Forças Armadas na Amazônia Legal, como está representado na linha do tempo.

A  operação mais recente foi instituída pelo  Decreto nº 10.730, DE 28 de junho de 2021, que autorizou o emprego das Forças Armadas no período de 28 junho a 31 de agosto de 2021, em 26 municípios  do Amazonas, Mato Grosso, Pará e Rondônia, seguida da publicação da Portaria GM-MD nº 2.728, de 29 de julho de 2021, que regula o emprego das Forças Armadas na chamada “Operação Samaúma” nos municípios representados no mapa, abrangendo nestas localidades as terras indígenas, as unidades federais de conservação ambiental e as demais áreas sob propriedade ou posse da União.


Linha do tempo das GLOs na Amazônia

Equipe Editorial (Liuca Yonaha, Marta Salomon, Melissa Aragão, Ester Athanásio, Marco Vergotti, Renato Tanigawa, Taciana Stec, Wendell Andrade, Daniel Porcel, Caio Victor Vieira, Beatriz Calmon, Rayandra Araújo e Daniela Swiatek).

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